Esta noite, senti uma vontade imensa de apreciar
a minha Cidade, lá do alto da montanha.
E fui até lá.
Acomodei-me no mirante.
Observei a noite de luar. Que maravilha !
Identifiquei o lugar em que nasci, a rua onde moro...
tudo é muito bonito.
Parece uma árvore de natal, com os seus enfeites, e
encantos.
Estava absorto em meus pensamentos, e quase nem
pressenti um homem aproximar-se daquele lugar.
Pelo seu comportamento, logo deduzi tratar-se de um
morador de rua, um mendigo, quem sabe ?
Educado, cumprimentou-me, e perguntou se não me
aborrecia com a sua presença. Imagina !
Estava barbeado, não cheirava a álcool, usava
sapatos, e as roupas não estavam rasgadas.
Sob o piso do mirante, guardava os seus pertences,
e passava as suas noites.
Bom de conversa, prendeu a minha atenção.
Ajudou-me identificar os diversos pontos da Cidade.
Disse-me, mais:
" Estou neste lugar, desde 2006. Não o troco por outro.
Subo e desço, esta montanha, diariamente.
Não tenho vizinhos, ninguém me incomoda, e os
animais silvestres já se acostumaram comigo.
Dou-lhes as sobras dos alimentos, que a Cidade me
oferta.
Não me sinto só, pois escuto tudo o que as pessoas
conversam, lá em baixo... pelo menos, imagino.
Sei o que estão fazendo, comendo, bebendo, se
divertindo. E isto me faz bem. Basta-me, pois já vivi
esta vida, e não me adaptei.
Amei e, creio, tenha sido amado, também.
Não pretendo fazer ninguém infeliz, com este meu jeito
de viver, ou ser chamado de egoísta social...
Tenho consciência, não é para qualquer pessoa.
É para quem ama a liberdade, a verdade sem hipocrisia,
ou desfaçatez.
Sou, apenas, um homem feliz que, hoje, conversa com
o céu, mesmo que não mereça a atenção de Deus.
Falo com as estrelas, com o vento, com a lua, com a chuva,
e, quando ele aparece, com o sol.
Toda a natureza me acolhe.
Quem não me conhece, diz que sou louco.
Mas há os que me chamam, e não sei porque, de poeta...."
Fiquei mudo.
Como já era tarde, prometi voltar outro dia, para a conversa
reiniciar...
Meu Deus, conversei com um mendigo poeta !