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quarta-feira, 25 de julho de 2018

Conto poético: PERSEGUIÇÃO A UM ESMOLEIRO



Pelo menos, duas vezes por semana, lá estava  ele,
em sua velha cadeira de rodas, na porta do mercado
público.
Sem as duas pernas... comovia a todos que prestavam
atenção.
Uma moeda aqui, uma nota ali... e, no final do dia, 
a  caixinha cheia.
Despertou ciúmes em outros esmoleiros.
Começaram, então, as denúncias.
" Ele tem as pernas, pode trabalhar" .
Fiscalizado pelo poder público, o esmoleiro não tinha
as duas pernas.
" Libera o coitado".
Mas a polícia ficou de olho, pois houve quem jurasse
te-lo visto, nss  cercanias, andando normalmente e
frequentando os bares  noturnos.
" Ele quer dinheiro para beber cachaça".
Um mistério para o Investigador Policial, " Lenço
Verde". Um verdadeiro "perdigueiro".  Famoso...
Certa noite, o "esmoleiro" caiu no flagra.
Andando, muito bem, com suas pernas,  bebia
um belo copo de cachaça, sorrindo e debochando
da sociedade  comovida.
Atrás das grades, no dia seguinte e já sem o 
efeito etílico, pediu para falar com o Doutor Delegado.
Quero saber por que fui preso ?
Por haver bebido álcool ?
E o Doutor Delegado explicou, educadamente, que
ele foi preso por  ludibriar as pessoas,  pedindo 
esmolas,  fingindo uma  deficiência física, inexistente.
Neste exato momento, chega àquela Delegacia o 
herói ",  Lenço Verde", empurrando a cadeira de rodas
com  o Irmão gêmeo do  preso,  sem as duas pernas.
Finalmente,  tudo ficou devidamente esclarecido....
 
Sinval Silveira



quarta-feira, 18 de julho de 2018

Conto poético: EU ESTAVA LÁ...




Passaram-se muitos anos...
Não se esquece um gesto, quase Divino.
Cinco  meninos  descendo o "Morro  da Cruz", nesta
minha querida Cidade, a caminho do campinho de
futebol.
O sol  de verão  levantava o cheiro doce do "capim 
melado".
Os cães ladravam, mas não se  aproximavam, por  
preguiça  ou  aconchego da sombra fresca do bambuzal.
As  cigarras cantavam, sem parar, parecendo um coral
de vozes, enquanto os passarinhos,  calados, se 
limitavam  a  escutar.
Através atalhos,  seguiam  pelos fundos das casas, 
para diminuir  o tempo  da chegada.
Havia de tudo, até vagabundo bebendo cachaça, 
fazendo arruaça.
Mulheres brigando, crianças chorando.
Mas,  a  euforia  era  incontrolável. 
A fome, também...
Um deles tirou do bolso um pequeno pão,  dividindo
com os  demais.
Apenas uma  dentada,  mas o  suficiente para calar 
o grito brutal  do estômago.
Que gesto,  meu Deus !
Quem poderia  esquecer um episódio deste ?
Eu estava lá...
 
Sinval Silveira




sexta-feira, 13 de julho de 2018

Poema: SEIXO ROLADO


Corrente  d´água agitada...
De onde vieste  ?
Sei,  já  foste grande, um dia !
Hoje és um seixo,  talvez cansado de tanto rolar.
Grande,  não chegarás ao teu destino.
És pesado, a água não te levará.
Cambaleante,  mudas de lugar a todo instante,
querendo o mar alcançar.
Persistente, ontem estavas lá. 
Hoje, aqui, em minhas mãos.
Lindo, lapidado ao longo dos anos, te comparo
aos desenganos que a vida nos traz.
Já foste, quem sabe, uma montanha que ao 
mar deseja chegar, na forma de um pequenino 
grão de areia.
Ninguém te reconhecerá,  nem saberá  do teu
sofrimento,  nas correntes das águas frias,
querendo  um  abraço da  onda do  mar.
 
Sinval Silveira

domingo, 1 de julho de 2018

Poema: SAUDADE VITORIOSA



Passo a passo, cheguei à frente  da casa.
Quando fui embora, as árvores eram tão pequenas...
As paredes  refletiam o brilho da felicidade !
Na varanda, habitava uma família de sabiás.
Não há mais vestígio do ninho.
Também, deixaram este lugar.
O barulho do mar e o vento, permanecem  como 
testemunhas, e a velha pitangueira oferece-me
seus doces frutos, como num abraço de boas vindas.
A caixa postal denuncia o abandono, saturada de
papéis  vencidos.
Os vizinhos me cumprimentam e reconheço alguns.
Finalmente,  reúno fragmentos de coragem e resolvo 
adentrar.
Não há mais nada em seu interior, além dos móveis
e lembranças... muitas lembranças
Abro todas as portas,  janelas  e deixo o vento renovar
o ar. 
O sol, faceiro, espanta a penumbra do passado.
o beija-flor branquinho vem me cumprimentar, entrando 
 e saindo  várias vezes.
" Esta casa também é tua, amiguinho ! "
Falou meu coração.
Fecho os olhos e sou transportado ao passado.
Escuto vozes  e um profundo silêncio invade o ambiente.
Fui embora, o tempo passou e  as pessoas, também.
Somente eu voltei,  e nem sei porque.
Creio que a saudade foi mais forte. 
Venceu a promessa que fiz de  nunca mais voltar...
 
Sinval Silveira